A busca dos povos por meios, recursos e insumos para sua sobrevivência não tem limites. Seu mais recente alvo é, quem diria, o jumento, o nosso jegue, também conhecido como jerico. Isso mesmo. Esse asno, cujos primeiros passos como animal de carga e montaria, nos campos do baixo Egito, datam de 5.000 a. C., celebrado em canto e verso por Luiz Gonzaga, o rei do baião, como “o maior desenvolvimentista do sertão”, é cobiçado pela maior população do planeta, a chinesa, que aguarda o momento de degustar as iguarias que dele se produzirão, com a importação de 300 mil jumentos por ano do Nordeste brasileiro (O Estado, 13/03/2012)
A faca chinesa passa ao largo da significação do asinino na cultura nordestina. Afinal, aquele país abate 1,5 milhão de burros ao ano, que passam por processo envolvendo tecnologia de ponta. Para os chineses, o que faz sentido é proteína animal, sendo incompreensível o lero-lero que nossos trovadores começam a expressar no resgate de poéticos relatos de quem “arrastou lenha, madeira, pedra, cal, cimento, tijolo, telha, fez açude, estrada de rodagem, carregou água, fez a feira e serviu de montaria”.
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O “tratamento digno” que sites, protetores de animais e artistas exigem ao “jumento, nosso irmão” só tem lógica, para os estômagos asiáticos, se ele for transformado em tira gosto.
Por trás da estratégia de transformar o jumento em atrativa cadeia econômica para os Estados nordestinos, há uma engrenagem que conecta os fios da modernidade com os braços do Estado social.
Tradução: a motocicleta expulsa o jegue dos campos. O flagrante: motos cercando gado, buscando água, transportando materiais e pessoas. Já a compra do veículo se deve ao programa Bolsa Família e às facilidades de crédito.
Depois de perder tarefas tradicionais, os animais, abandonados por proprietários, saem das fazendas para circular em estradas e ruas das cidades, sinalizando o fim de um tempo.
Por Gaudêncio Torquato
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